Uma pesquisa desenvolvida no Hospital Universitário Júlio Müller, da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT), identificou a espécie Paracoccidioides lutzii como agente causador de uma forma grave de micose pulmonar que afeta principalmente trabalhadores rurais, garimpeiros e pessoas em contato frequente com o solo. A descoberta do fungo, confirmada em 2014, após mais de uma década de investigações, é fruto de um trabalho conduzido por pesquisadores do hospital e da universidade, e tem impactos diretos no diagnóstico de uma das principais doenças fúngicas endêmicas do país.

A Paracoccidioidomicose (PCM), como é conhecida, é uma infecção sistêmica causada por fungos do gênero Paracoccidioides. Em Mato Grosso, a doença ocupa a oitava posição entre os principais problemas de saúde pública. A nova espécie identificada, P. lutzii, tem sido responsável por casos em que pacientes apresentam sintomas clínicos clássicos — como tosse persistente, lesões na mucosa oral e nasal, aumento de gânglios cervicais e emagrecimento acentuado —, mas com exames sorológicos negativos.
“Já em 2003, notamos que algo não estava de acordo com o que era esperado. Os pacientes estavam claramente doentes, mas os exames, feitos com antígenos padrão de outras regiões, não detectavam a infecção”, explica a coordenadora da pesquisa, a pós-doutora em micologia médica Rosane Hahn.
O fungo, presente no solo, é inalado por indivíduos que trabalham diretamente com a terra. Ao penetrar nos pulmões, os esporos se transformam na forma parasitária e provocam a doença. Embora em muitos casos a manifestação seja pulmonar, a infecção pode se espalhar para outros órgãos, incluindo pele, ossos, olhos e até o sistema nervoso central — quadro conhecido como neuroparacoccidioidomicose, forma mais grave da doença.
Com o apoio do Ministério da Saúde, a equipe do HUJM-UFMT está desenvolvendo um antígeno laboratorial específico capaz de detectar tanto a P. lutzii quanto outras espécies do complexo Paracoccidioides. A previsão é de entrega do antígeno ao Ministério da Saúde no final de 2025.
Atualmente, os exames sorológicos disponíveis no SUS (Sistema Único de Saúde) utilizam antígenos que não reconhecem a nova espécie, o que pode gerar resultados falso-negativos e comprometer o diagnóstico e o acompanhamento adequado dos pacientes. “Nosso objetivo é oferecer uma solução mais precisa, que fortaleça os serviços de vigilância e diagnóstico em todo o país, especialmente nos laboratórios públicos que lidam com doenças endêmicas”, afirma a pesquisadora.
A nova tecnologia deve beneficiar os Laboratórios Centrais de Saúde Pública (Lacens) em diversos estados e facilitar o trabalho de profissionais que atuam em regiões onde a infraestrutura laboratorial é limitada. “Além de ampliar a capacidade de diagnóstico, esse antígeno permitirá que os pacientes sejam monitorados com mais precisão durante o tratamento, com exames seriados que indicam a evolução clínica”, explica Rosane.
O projeto também destaca a importância da formação de recursos humanos em micologia médica e da integração entre pesquisa científica e assistência à saúde. O HUJM-UFMT faz parte da Rede da Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (Rede Ebserh) desde novembro de 2013. Vinculada ao Ministério da Educação (MEC), a Ebserh foi criada em 2011 e, atualmente, administra 45 hospitais universitários federais.
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